A BALADA DE ADAM HENRY - QUANDO A MELHOR ESCOLHA NÃO É O QUE IMAGINAMOS



Depois de um longo silêncio devido ao excesso de trabalho, estou de volta. E, como estou de férias – e nessa época me dedico a leituras mais leves – vou dar uma série de dicas de leituras para esses momentos de maior leveza. E como primeira dica, veremos uma obra que trata de liberdade de escolha e suas consequências.

Você já parou para pensar em como suas decisões ou escolhas interferem na vida de outras pessoas envolvidas? Qual seu grau de responsabilidade sobre o que vai acontecer a partir do que você resolveu? Foram esses questionamentos que me fiz ao ler A Balada de Adam henry, do escritor inglês Ian McEwan.

Confesso que não foi o livro mais profundo que já li, considerando o fato de ser um dos maiores autores ingleses da atualidade, o texto desse livro foi até óbvio e de fácil percepção de como seria o fim, mas isso não desmerece a obra. Por ter um texto simples, enxuto e sem “gordura”, a sua leitura tornou-se algo leve, o tipo de livro que escolhemos para ler na beira da piscina ou num passeio na praia (aproveitando o clima quente e a época de férias).

E do que trata o livro? Precisamente de escolhas. O enredo gira em torno de uma juíza do tribunal de pequenas causas. Considerada brilhante e dentre as melhores de Londres, ela pega casos complicados, principalmente ligados à religião. Apesar do sucesso profissional, seu casamento está ruindo; a magistrada está perto dos sessenta anos e na noite em que seu marido sai de casa ela pega o caso de um rapaz (Adam) que está com leucemia e precisa de transfusão de sangue para o tratamento, mas com um agravante: ele e a família são testemunhas de Jeová, todos estão de acordo em não receber a transfusão e há um amparo legal para que a escolha dele, um rapaz inteligentemente sagaz, tenha direito a decidir o tratamento mesmo sendo menor.E todas as escolhas na vida dessa juíza implicam em algo adverso ao que ela deseja. Ela escolhe se dedicar à carreira implicando em não ter filhos e mais adiante, as sucessivas promoções e maiores responsabilidades a afastam cada vez mais de seu marido - que o leva a arrumar uma amante, crise que desenrola no momento em que começamos a ler o livro. Seu casamento degringolando, a vergonha de, a essa altura da vida, se ver separada. Porém, mesmo a afligindo ela mantém a postura e opta pelo trabalho.


E chegamos a outra escolha que leva a implicações na vida da protagonista. Chamada para julgar o caso do jovem Adam Henry, dezessete anos, muito inteligente e lúcido, decidido a morrer como mártir de sua religião, romanceando tudo que está acontecendo consigo. Ao decidir conhecer o rapaz para tomar sua decisão ela leva algo ao jovem que ele até então não havia experimentado: vontade de viver e conhecer o mundo fora de sua fé. Enquanto isso, ela decide impor o tratamento e salvar o garoto (não é spoiler) acreditando que está fazendo bem ao jovem por ver uma grande possibilidade no menino. E é aí que a decisão da juíza mais uma vez trará complicações. Adam se desentende com os pais e sua religião, vai atrás dela, pede para ser educado pela mulher e sua recusa leva a um desfecho trágico.

Não falarei mais do livro e sim das minhas impressões. Realmente, levou-me a refletir o quanto somos egoístas, muitas vezes, ao impormos nossas decisões aos que nos vêm em auxílio, porém, o que percebemos como bom para a outra pessoa nem sempre é realmente algo que vá trazer qualquer ajuda ou benefício. Ao decidirmos por alguém impondo nossa vontade em detrimento ao poder de escolha e liberdade de nosso interlocutor, estamos privando-o do seu direito de resolver suas dificuldades a partir de sua própria vivência e realidade. Como muitas vezes nossa visão de mundo é diferente por termos vivenciado outras experiências, criamos a expectativa que nós é quem sabemos o que é melhor para a outra pessoa ignorando a realidade dela e como ela é inserida nisso tudo.

Um livro simples, singelo e ao mesmo tempo difícil, mas não por qualquer complexidade da escrita e sim porque nos leva a uma autorreflexão (que no fundo é o papel da literatura) e mudar gera sempre alguma dor. Mesmo não sendo o livro mais brilhante de McEwan, é um livro que vai tirar você de sua área de conforto e esse, no fundo, é o objetivo de todo grande autor. Até a próxima.

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