Depois
de um longo hiato – provocado por razões profissionais (e algumas pessoais) –
caro leitor deste humilde blog, estou de volta com muitas obras para falar e
muita música para indicar na já cativa coluna: Livros Para Ouvir.
Como os que frequentam sabem (caso tenha novos leitores aqui – sejam muito bem
vindos), essa coluna se propõe a mostrar livros que inspiraram canções de rock ‘n
roll, gênero que me agrada e faz parte da minha formação cultural na origem e a
obra abordada hoje é um clássico que inspirou uma das maiores bandas de rock do
mundo e que é tema de um dos maiores clássicos desse gênero tão controverso. A banda?
Rolling Stones. A canção? Simpathy for the Devil. O livro? O Mestre e a
Margarida.
Escrito
pelo autor ucraniano, Mikhail Bulgákov, o livro é considerado a maior obra da
literatura russa no século XX e levou doze anos para ficar pronto, além de só ter
sido publicado em 1966. Considerado satânico, foi proibido em vários países
durante muitos anos, inclusive na então URSS por conta de seu conteúdo
extremamente crítico ao regime comunista – do qual o autor era crítico ferrenho
e opositor.
E
toda essa polêmica foi causada a partir do próprio enredo. Nele, Lúcifer (sob a
alcunha de Woland, um mago) chega à Moscou junto com um estranho séquito de
demônios: Koroviev, Azazello e Behemoth, um gato que anda sobre duas patas e
joga xadrez e provoca um grande estrago na vida dos habitantes da cidade
durante a sua estadia. Em paralelo a isso, é narrado o enredo de um livro, cuja
a história se passa em Jerusalém, no dia da crucificação de Jesus mostrando o
diálogo inusitado entre Jesus e Pilatos.
Tendo
o romance entre o Mestre e a Margarida, ele um escritor frustrado e autor do
romance em questão, que tem sua obra recusada pelo governo para ser publicada;
ela, uma jovem rica, casada e infeliz como pano de fundo para a narrativa, o
texto é uma impactante crítica ao regime soviético (sem contar que durante
muitos anos foi considerado uma obra satânica). E essa crítica é feita através
da passagem de Woland (o Diabo em pessoa).
Através
das mortes e punições promovidas por Woland, o autor do livro expõe toda a
hipocrisia e problemas provocados pelo regime de Stalin. Ao levar a plateia do
teatro ao extremo ridículo de brigar por pedaços de papel ou fazer com que
mulheres saíssem nuas pelas ruas da capital russa, Bulgákov – através da
personagem – mostra o quanto era gananciosa e sem escrúpulos a população do
país. Passagens como o coral que começa a cantar sem vontade e sem se controlar
ou o funcionário público que desaparece e sua roupa continua executando a sua
tarefa mostram como era nocivo à sociedade a repetição de comportamentos
forçada e a burocracia estatal.
O
próprio personagem do Mestre é uma espécie de alter ego do autor. Por sua
oposição ao regime stalinista, Bulgákov teve suas obras cerceadas pelo governo
e colocado em ostracismo (por stalin apreciar suas peças, ele não foi morto
pelo regime) pedindo ao ditador para sair do país para que pudesse publicar
suas obras. Assim é com o Mestre (seu nome não é citado). Seu livro é recusado
e ele entra em depressão, indo parar num hospício ao se ver sem sua amada,
Margarida – inspirada na terceira esposa do autor – e sem o reconhecimento da
sua obra.
Um livro que explora bastante o realismo fantástico,
algo pouco comum na literatura russa de então, a obra deve ser apreciada tanto
por sua narrativa inventiva e dinâmica quanto por sua crítica a um regime
nefasto que dizimou milhões de pessoas durante as décadas em que foi mantido
naquele e em outros países. Sua narrativa foi tão importante para a literatura
mundial que não só os Rolling Stones foram inspirados pelo romance, até mesmo
nomes de bandas, como o caso da banda de Black Metal, Behemoth, nome esse
inspirado no gato infernal. Um abraço e até a próxima.
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