Cresci num bairro
pobre, no subúrbio do Rio de Janeiro, e uma das relações mais fortes que
existiam na época em que era moleque eram os laços de amizade. A molecada
estava sempre junta, fosse na escola ou na rua em que morava. Havia um senso de
lealdade e, normalmente, se tinha confusão com um, a confusão era com todos do
grupo. Lembro de muitas brigas e arruaças por conta disso. Mesmo que houvesse
brigas internas, quando acontecia de um dos nossos passar por problemas, o
problema passava a ser de todos. Essas lembranças me assaltaram durante a
leitura de uma obra que li por volta de 2015, coincidentemente terminado no dia
da notícia da morte de um amigo dessa época e que me deixou muito emocionado.
Um livro que trata disso: lealdade, amizades fortes e proteção mútua numa vida
juvenil pobre e hostil. O livro? Outsiders - Vidas Sem Rumo, de Susan E.
Hinton.
A obra é um livro
de transição. Como foi dito acima, Ponyboy vai começando a entender o mundo que
o cerca à medida que as coisas vão acontecendo. Ao conhecer Cherry, namorada de
Bob (o Soc assassinado), descobre que a vida também apresenta desafios,
desilusões e dificuldades aos rapazes do lado rico da cidade e que não há muita
diferença entre os dilemas dos mais pobres como ele e os mais ricos. Quando
volta depois de cinco dias fugido após o assassinato, percebe quanto o melhor
amigo de Bob também está com medo do que pode acontecer e pela primeira vez
percebe que a linha social que separa os dois grupos é mais elástica e difusa do
que eles pensavam.
Além dessa
percepção, o garoto começa a entender as razões do seu irmão mais velho, Darry
ser tão duro com ele e tão frio. Acreditando-se um estorvo em casa e que ele
não o ama mais, após a morte dos pais, ele não se dá conta de que medo que o
mais velho tem de perder a guarda dos irmãos e como tenta fazer com que a vida
do mais novo, mais inteligente e sensível dos três possa ser melhor do que a
que eles têm, faz dele alguém muito mais amadurecido para a pouca idade (tem
apenas 20 anos). Só perto do fim o caçula percebe o esforço conjunto dos irmãos
para criá-lo, entende porque seu irmão do meio abandonou os estudos e passa a
respeitar e também compreender as razões do primogênito. Ponyboy vai
crescendo aos poucos. Seu amadurecimento acontece à medida que tudo acontece,
vê o quanto desperdiça sua vida com delinquência, sendo ele um menino
brilhante, entende os vínculos afetivos que se formam na dor e desespero e,
acima de tudo, mostrar a força da amizade e lealdade entre seus pares.
Esse é o ponto
forte do livro. Mesmo sendo centrado na vida de Ponyboy e seu despertar para a
maturidade, a lealdade e os laços firmes de amizade é que saltam aos olhos e o
que fica no fim das contas. Todos os amigos estão sempre juntos, cresceram
juntos, estão a todo momento se protegendo e no momento mais difícil, que é na
morte do atormentado e solitário Johnny, eles se unem em torno do garoto. Mas,
o mais tocante momento desse sentimento que permeia a obra é a morte de Dallas.
Membro do grupo, delinquente profissional e que ajuda os garotos a fugirem e se
esconderem, Dallas é o mais próximo e quem mais protege Johnny. Com sua morte
fica claro que a vida de um só tem sentido com o outro, haja vista a idolatria
deste para aquele. Com a morte de Johnny, Dally perde a cabeça, entra em desespero
e num último ato, provoca a própria morte por não ver mais qualquer sentido na sua
vida sem o seu melhor e talvez único amigo.
Um livro forte e
emocionante, principalmente para quem tenha vivido num bairro pobre como o do
livro ou tenha tido laços de amizade como esse desses meninos. E quando você
pensa que a qualquer momento um desses amigos pode partir de forma trágica,
você com certeza vai reavaliar suas convicções quanto a estar com os seus.
E essa foi a dica da semana, que eu gostaria de dedicar aos meus velhos
e mais próximos amigos que cresceram comigo no meu bairro e em especial ao Léo,
que partiu de forma trágica e triste num fatídico janeiro de 2015, que ele
tenha encontrado a paz que não teve nesse plano. Até a próxima.
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