RATOS E HOMENS – É IMPOSSÍVEL SER FELIZ SOZINHO



Um tema que tem sido recorrente em minhas observações literárias é a amizade e como esses laços se manifestam durante a vida. O hipotético leitor desse blog pôde ver isso em It, como essa relação ampara a transição da infância para a vida adulta e como esse tipo de laço fortalece e traz segurança; assim como também viu como pode deixar feridas por toda uma vida depois de se perceber abandonado por aqueles que temos como amigos mais leais, que é mostrado em Sobre Meninos e Lobos.

Dentro dessa temática, mas olhando por um terceiro prisma, temos laços de amizade que podem ser criados não por um sentimento de lealdade fraternal e sim, por um desejo de não se perceber sozinho no mundo, como se estivéssemos à deriva sem a quem nos amparar, essa foi a percepção que tive ao ler Ratos e Homens, de John Steinbeck, a dica de leitura do mês do Professor.

A novela narra a amizade entre dois tipos bem distintos: George, um homem esperto e que sonha em ter seu canto no mundo e Lennie, um homem extremamente grande, extremamente forte e estúpido na mesma proporção. Eles são andarilhos que rodam pelas estradas da Califórnia da Grande Depressão em busca de trabalho nas fazendas da região. E a trama começa com eles justamente fugindo de uma fazenda e indo tentar conseguir emprego em outro lugar depois de Lennie mais uma vez colocá-los numa situação desconfortável.

Durante toda a narrativa, já na nova fazenda, George tenta manter o brutamontes gentil longe de confusão. Por ter a mentalidade de uma criança no corpo de um gigante, Lennie não mede sua força e sempre que se vê encantado com algo (de animais pequenos a pessoas) tende a machucá-lo. Entretanto, apesar de constantemente se ver fugindo e perdendo oportunidades de trabalho por causa do grandalhão, há um forte sentimento protetor por parte dele, por saber que o companheiro de viagens não é capaz de cuidar de si.

Esse é um laço que surge ainda quando são garotos e quando ambos se percebem sozinhos no mundo, passam a andar juntos e o George a cuidar de Lennie (promessa feita a tia deste). O mais esperto tem toda a consciência de que seus sonhos poderiam se realizar se este se livrasse do gigante, mas ele já se acostumou com a companhia de Lennie, ao alimentar o sonho de criar coelhos do grandão, ele acaba também alimentando os próprios sonhos de seguir em frente. E esse laço se consolida mais por medo da solidão do que propriamente um sentimento de afeto. George se sente responsável por Lennie devido à promessa, mas também porque no fundo sabe que sem ele ao seu lado a vida seria mais dura.

No fim, mais uma vez Lennie os coloca numa situação complicada ao cometer um assassinato acidentalmente. E George se vê obrigado a tomar uma decisão drástica. Nesse momento ele se percebe só e desamparado porque, além de ter a noção de que terá que se livrar do grandão, também se dá conta de que o sonho que ele alimenta ao alimentar o sonho do amigo é apenas isso, um sonho. Ele é confrontado com uma realidade dura de que ele tentava fugir se ancorado nessa estranha amizade.

Assim são os laços que unem as pessoas algumas vezes. Nem sempre são escolhas movidas por afinidades ou mantidas por um sentimento fraternal e de lealdade, algumas vezes, esses laços são criados pela circunstância e por mais problemático que possa ser, por mais situações difíceis em que nos coloque, por mais dor que possa nos causar, ele também nos dá a sensação de que somos importantes para alguém, de que temos um lugar no mundo e que ainda é possível sonhar com uma vida melhor. E esses laços fazem com que a solidão não nos atinja, fazem com que não caiamos no abismo do silêncio barulhento de nossos pensamentos mais sombrios e servem para aliviarmos o desespero e angústia de nos percebermos à deriva no mundo, é como diz a velha canção que dá título ao texto: “é impossível ser feliz sozinho”. Essa foi a dica do professor, até a próxima e fiquem com Deus.

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